Mudança legal permite ao BC importar cédulas e moedas

Fonte: Rede Brasil Atual

Uma medida provisória editada no ano passado, que se tornou um projeto prestes a ser sancionado pelo presidente Michel Temer, permite ao Banco Central importar cédulas e moedas de real. O BC afirma que a preocupação é administrar estoques. Para o sindicato dos funcionários da Casa da Moeda, única fabricante brasileira, a medida era desnecessária.

A Medida Provisória 745 foi aprovada em 23 de novembro por uma comissão mista no Congresso. No último dia 8, o plenário do Senado aprovou a MP, originando o Projeto de Lei de Conversão (PLV) 33, que seguiu para sanção presidencial. Houve divergências durante a tramitação. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ), líder da minoria, por exemplo, disse que a medida, embora emergencial, pode comprometer o futuro da Casa da Moeda do Brasil (CMB), empresa ligada ao Ministério da Fazenda.

“Vivemos uma crise nesse momento, mas o texto do projeto de conversão acaba de uma vez por todas com a exclusividade da Casa Moeda, que é uma empresa pública extremamente lucrativa e tem cerca de 3 mil funcionários. Temos que condicionar essa aquisição do meio circulante no exterior à capacidade de produção da Casa da Moeda”, afirmou Lindbergh.

Para o líder do governo, senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), essa preocupação está contemplada no texto final. “O Banco Central só pode importar desde que se caracterize, com muita clareza, em um tempo definido pela lei, a inviabilidade ou a fundada incerteza quanto à inviabilidade do atendimento.”

Ontem (15), havia 24,685 bilhões de moedas em circulação no país, com um valor total de aproximadamente R$ 6,3 bilhões. As cédulas somam 5,862 bilhões de unidades e R$ 205,1 bilhões. O BC atualiza os dados diariamente.

Custo de produção

A autoridade monetária afirma que “restrições orçamentárias e dificuldades operacionais” da Casa da Moeda limitaram a produção nos últimos anos. Mesmo assim, em 2016 o BC adquiriu 761,3 milhões de novas moedas, 11% a mais do que no ano anterior, e 405 milhões de novas cédulas de R$ 2 e de R$ 5, 10% a mais do que o previsto.

Apenas no ano passado, a despesa com aquisição de cédulas, incluindo as já adquiridas no exterior, somou R$ 299,8 milhões. O gasto com moedas foi de R$ 224,7 milhões. O BC informa que, em 2016, adquiriu no exterior 100 milhões de cédulas de R$ 2, com um custo “cerca de 20% inferior” ao pago à Casa da Moeda. É a segunda vez que o Brasil encomenda dinheiro no exterior. Isso aconteceu durante o lançamento do Plano Real, em 1994.

O custo para fabricar dinheiro revela que, em alguns casos, o valor da produção excede o valor de face. Isso acontece com as moedas de menor valor. As de 5 centavos, por exemplo, custam R$ 282,13 o milheiro (mil unidades), o que significa 28 centavos por unidade. Na de maior valor, a de 1 real, o milheiro sai por R$ 428,30, ou quase 43 centavos por moeda. Com as cédulas, o valor unitário é sempre menor que o de face (confira quadro).

Para 2017, o Plano Anual de Produção prevê aquisição de 960 milhões de cédulas e 580 milhões de moedas. “O BC está finalizando a negociação para a encomenda da totalidade do numerário com a Casa da Moeda”, diz a instituição, que defende ainda a redução do fenômeno conhecido como “entesouramento”, referindo-se ao hábito de parte da população de guardar dinheiro em casa, principalmente. De acordo com estimativa do BC, esse dinheiro “entesourado” corresponde a 7,4 bilhões de moedas.

Parlamentares afirmam que a medida atinge a soberania brasileira. Segundo o BC, a votação da MP “mostrou a sua adequação na medida em que prioriza o cidadão e sua disponibilidade de papel-moeda”.

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Sem motivo razoável

O presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores na Indústria Moedeira, mais conhecido como Sindicato dos Moedeiros, Aluizio Júnior, afirma que “com certeza” não havia necessidade de implementação da medida. “O Banco Central sempre dava a previsão da necessidade de produção no segundo semestre do ano anterior, para a Casa da Moeda se organizar. O que ocorreu foi que, em 2015, o BC não mandou a previsão de 2016”, diz Aluizio, lembrando que a própria CMB fez essa argumentação, mas isso foi omitido no pedido de medida provisória feito à Presidência da República.

Ainda segundo o sindicalista, havia um estoque de cédulas e moedas disponíveis para o mercado, com valor de face R$ 12 bilhões. “Não tinha um motivo razoável para fazer o pedido. Eles transformaram uma coisa que é corriqueira como motivação para pedir a MP”, afirma. “Mesmo com espaço de tempo de curto, a Casa da Moeda entregou a produção.” Aluizio vê uma espécie de “retaliação”, já que até 2015, segundo ele, o BC tinha o controle da área de produção da Casa da Moeda.

Ainda segundo o presidente do  Sindicato dos Moedeiros, a empresa – cuja fábrica fica no distrito industrial de Santa Cruz, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro – tem maquinário moderno e segurança, e está apta para atender à demanda, com capacidade de produção de 4 bilhões de cédulas. Mas existe receio com a mudança de gestão e possíveis iniciativas no sentido de ampliar a terceirização. “Você percebe o tempo todo o interesse de diminuir o tamanho do Estado”, afirma. A CMB tem aproximadamente 2.750 funcionários diretos.

Até então uma autarquia, a Casa da Moeda tornou-se empresa pública em 1973. A receita líquida de vendas foi de R$ 2,407 bilhões em 2015, acima de 2014 e abaixo de 2013. Em julho do ano passado, tomou posse como presidente o administrador de empresas Alexandre Borges Cabral, funcionário de carreira do Banco do Nordeste e indicado pelo PTB. O atual titular da Diretoria de Cédulas e Moedas – uma das quatro diretorias da Casa da Moeda –, Jehovah de Araújo Silva Junior, veio de indicação do relator do impeachment, deputado Jovair Arantes (PTB-GO). Após a abertura do processo de impeachment na Câmara, a então presidenta, Dilma Rousseff, exonerou Mauricio Visconti Luz, que também havia entrado na CMB por indicação do partido, notadamente do deputado Nelson Marquezelli (SP).

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